terça-feira, 28 de outubro de 2014

Descendentes de participantes da Revoluçaõ de 1817.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Bento José da Costa Junior e Emília Júlia Pires Ferreira



João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG
No dia 6 de março de 1817, teve início, em Recife, uma revolução, também conhecida como Revolução dos Padres. Teve curta duração, e dela resultou o assassinato de André de Albuquerque Maranhão, que chefiou, por curto espaço de tempo, os rebeldes do Rio Grande do Norte. Quem também pagou com a vida, por dela participar, foi nosso Frei Miguelinho, arcabuzado em Salvador, em 12 de junho de 1817. Nessa mesma data e lugar, também foi arcabuzado, outro líder desse movimento de independência, o capixaba Domingos José Martins.
Domingos, que vinha namorando escondido por cinco anos, Maria Theodora da Costa, casou, logo após a tomada do poder, no dia 14 de março, na Capela da Jaqueira. A noiva da Revolução, como ficou conhecida, era filha de Bento José da Costa e Anna Maria Theodora Moreira de Carvalho.   Bento e o sogro, Domingos Affonso Ferreira, além de participarem de várias arrematações de dízimos, aqui no Rio Grande do Norte, eram donos de muitas terras na Região das Salinas, incluindo aí, a Ilha de Manoel Gonçalves, Ilha de Macau, e Cacimbas do Vianna, fazenda de muitos gados. Com a morte de Domingos Affonso Ferreira, no começo do século XIX, Bento ficou com praticamente todas as terras, mas em 1834 faleceu, e as terras herdadas pelos filhos, principalmente as da região salineira, foram vendidas somente em 1868, por Bento José da Costa Junior e a esposa Emília Júlia Pires Ferreira para José Gomes de Amorim.
Esse casal foi padrinho em um batismo, aqui no Rio Grande do Norte, em 1845, como podemos ver do registro a seguir: Maria, filha do major José Martins Ferreira e sua mulher Dona Josefina Martins Ferreira, nasceu a dois de junho de 1845, e foi batizada a dezoito de agosto de 1846, no dito Comissário, por mim solenemente. Foram padrinhos Bento José da Costa (Jr.) e Dona Emília Júlia Pires Ferreira, por procuração ao capitão Pedro Alves Ferreira, e Dona Josefa Christiniana Ferreira, do que para constar fiz este assento, em que me assino. Manoel Januário Bezerra Cavalcanti, pároco colado do Assú.
O Comissário acima era em Cacimbas do Vianna, hoje pertencente ao município de Porto do Mangue, onde residiam nessa época meus trisavós, o major José Martins e sua esposa Josefina Maria. Os padrinhos de Maria moravam em Recife, onde casaram conforme o registro abaixo.
Aos vinte e cinco dias do mês de abril de mil oitocentos e vinte e cinco, com despacho do Ilustríssimo Senhor Vigário Capitular, Jerônimo Gonçalves dos Santos, pelas cinco horas da tarde nesta Freguesia, no Oratório da casa de residência de Gervásio Pires Ferreira, feitas as denunciações na forma do Sagrado Concílio Tridentino, nesta Matriz do Santíssimo Sacramento da Boa Vista, em três dias sucessivos, por despacho do mesmo Ilustríssimo Senhor Vigário Capitular donde a nubente é moradora, e nas suas Igrejas Paroquiais da cidade do Recife, donde o nubente é natural e morador, tendo a nubente justificada sua menor idade e sua naturalidade, e dispensados do grau de parentesco em que se acham ligados, sem se descobrir impedimento algum, de minha licença, em presença do Reverendo Vigário Virgínio Rodrigues Campello, e das testemunhas Gervásio Pires Ferreira, casado, morador nesta Freguesia, e o coronel Bento José da Costa, casado, morador no Recife, se receberam por palavras de presente Bento José da Costa Junior e Dona Emília Júlia Pires Ferreira, brancos; ele, nubente, filho legítimo do coronel Bento José da Costa e Dona Anna Maria Theodora Moreira de Carvalho, e a nubente filha legítima de Gervásio Pires Ferreira, e de Dona Genoveva Perpétua  de Jesus Caldas; e logo receberam as bênçãos nupciais conforme o Rito Romano, como consta da certidão, banhos, despacho, mandado de casamento e dispensa que ficam no arquivo desta Matriz; do que mandei fazer este assento que por verdade assinei. Vigário José de Sousa Serrano.
O português Domingos Affonso Ferreira era primo legítimo de Gervásio Pires Ferreira, pois sua mãe, Isabel Pires, era irmã de Domingos Pires Ferreira, pai de Gervásio. Daí o parentesco de Bento Junior com Emília Júlia, via Anna Maria Theodora, filha de Domingos Affonso.
Quando as capitanias foram transformadas em províncias, estas foram inicialmente governadas por uma junta governativa. Em Pernambuco, ela tinha sete membros e governou de setembro de 1821 a setembro de 1823, tendo entre seus membros, Gervásio Pires Ferreira, como seu presidente; Felippe Nery Ferreira, filho de Domingos Affonso Ferreira; e Bento José da Costa, genro de Domingos Affonso Ferreira.
Para finalizar, transcrevemos o batismo de uma filha do tenente-coronel Bento, irmã de Bento Junior: aos dezessete dias do mês de fevereiro do ano de mil oitocentos e cinco, na Capela de Nossa Senhora da Conceição das Barreiras (conhecida posteriormente com Capela da Jaqueira), de minha licença, batizou e pôs os Santos Óleos o Padre Antonio Gomes, da Congregação do Oratório, a Francisca, branca, nascida aos nove do dito mês e ano, filha de Bento José da Costa e sua mulher Anna Maria Theodora, esta natural da Freguesia de São Pedro Gonçalves do Recife, e neta paterna de Antonio José da Costa, e de Maria da Costa, e materna de Domingos Affonso Ferreira e de Maria Theodora Moreira de Carvalho. Foram padrinhos Bernardo José da Costa por procuração sua que apresentou Alexandre Affonso Ferreira e Maria Theodora Moreira de Carvalho, solteira. O vigário Gabriel Bezerra Bittencourt. A batizada devia ser Francisca Escolástica Josefa da Costa, que casou com Antonio da Silva Junior.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Mais um artigo baseado em inventário.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

João Gregório Antunes e Maria Alves Lessa




Por João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG

Nos inventários, busco as relações de parentesco, as localidades, as datas, as convivências. Dou pouca importância aos bens. Meu interesse inicial, pelo de João Gregório, se deu pelo nome da sua última esposa, que tinha o sobrenome de minha tetravó, Josefa Clara Lessa e, também, de José Álvares Lessa, que em 1810 vivia na Ilha de Manoel Gonçalves. Tento descobrir seus parentes.

João Gregório Antunes, o inventariado que apresento hoje, casou três vezes, deixando vivos desses casamentos, quando faleceu, 13 filhos. Não encontrei, até o presente momento, nenhum registro desses casamentos. 

Em 31 de agosto de 1871, no lugar Olho d’Água, do termo do Assú, em casa de residência da inventariante, Maria Alves Lessa, a mesma informou que seu marido, João Gregório Antunes, faleceu no mesmo lugar acima, no dia três de maio do dito ano de 1871, deixando por seus herdeiros: Martiniano Antunes Bezerra, casado com Antonia Brasileira Maria de Macedo, Josefa Maria Bezerra, casada com Zacharias Fernandes Junior e Antonio Gregório Bezerra, solteiro de vinte e três anos de idade, filhos do seus primeiro leito com Maria Bezerra; José Gregório Antunes, solteiro de vinte e dois anos, Maria Umbelina da Encarnação, solteira de 20 anos, Emígdia Maria da Conceição, solteira, de dezoito anos, Sabino Antunes Cabral, de dezesseis, Anna Maria da Conceição, solteira, de quatorze anos, Francisco Gregório Antunes, solteiro, de treze anos, Maria Francisca da Conceição, solteira, de dez anos, Maria Francisca do Rosário, de cinco anos, filhos do seu segundo leito com Francisca das Chagas; Luisa, de dois anos, e Manoel de um ano de idade, do seu terceiro leito com a inventariante, todos moradores nesse mesmo lugar.

Nos livros de batismos, encontro, até agora, três filhos de João Gregório Antunes e de Francisca das Chagas de Jesus. Vejamos os detalhes.

Emigdia nasceu aos 23 de março de 1857, e foi batizada aos 31 de maio do mesmo ano, na Capela de Nossa Senhora do Rosário da Várzea, tendo como padrinhos Vicente Rodrigues Ferreira e sua mulher Maria Joaquina da Conceição, com procuração de Balthazar de Moura e Silva e sua esposa Maria Fernandes de Moura.

Francisco nasceu em 1 de abril de 1859, e foi batizado aos 25 de abril do mesmo ano, na mesma capela acima, tendo como padrinhos Manoel Rodrigues Ferreira Jr. e sua esposa D. Belmira  Amorosa da Silveira.

Maria nasceu aos 10 de dezembro de 1862, e foi batizada aos 5 de abril de 1863, na Capela acima, tendo como padrinhos Gabriel Soares Raposo da Câmara Sobrinho e Leocádia Maria de Oliveira Cabral.

Como João Gregório Antunes não deixou testamento, nem foi possível encontrar os registros dos seus casamentos, não descobrimos quem eram seus pais. Entretanto, ele pode ter algum parentesco com Gregório José Antunes, que faleceu em 17 de janeiro de 1845, com a idade de 50 anos. Este último foi casado com Maria Thereza da Conceição. 

Anna Maria Vitória e Lourença Maria de Araújo, filhas de Gregório e Maria Thereza, casaram, respectivamente, com Domingos Fernandes Cruz e Manoel Ignácio da Rocha, a primeira em 1833, e a segunda em 1834.

Quanto a minha tetravó, Josefa Clara Lessa, suspeito que era filha de José Álvares Lessa. Por ser ele representante de Bento José da Costa, português do Recife, imagino mais ainda, que ele, José Álvares, seja o português, de Lessa da Palmeira, Arcebispado do Porto, casado com a brasileira Francisca Xavier, que batizou em 1790, na Matriz do Santíssimo Sacramento, do Bairro de Santo Antonio do Recife, sua filha Rita, tendo como padrinho o capitão-mor José de Souza Rangel. O vigário encomendado dessa Matriz, nessa época, era Feliciano José Dornelles, que foi, posteriormente, vigário da nossa Matriz de Nossa Senhora da Apresentação.

sábado, 11 de outubro de 2014

O angicano Pedro Avelino, que foi nomeado, em 1910, por Hermes da Fonseca, para Prefeito do Departamento do Alto Juruá, ​​não resistiu às desordens e acabou deixando o seu cargo. Veja o que ele conta​

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

 
As causas da deposição do jornalista Pedro Avelino.

João Felipe da Trindade

jfhipotenusa@gmail.com

Este artigo complementa dois outros, aqui publicados, de uma entrevista que o jornalista Pedro Avelino deu, após seu retorno de Acre, onde exerceu o cargo de Prefeito do Departamento do Alto Juruá.

Após a descrição do Acre e do Departamento do Alto Juruá, na entrevista para o jornal " A Imprensa", o major Pedro Avelino fez nova pausa.
-O Sr. Já falou ao Sr. Presidente da República e ao Sr. Ministro do Interior? Perguntamos.

-É justamente por não o ter feito que estou a pensar até onde iremos com esta palestra.

Perdão! Tendo o Sr. sido deposto, é natural o nosso desejo de saber as causas e os autores desse golpe, na pessoa do Prefeito que foi... E não seria indiscreto indagar?

-Ora, eu lhe conto: essa ideia de autonomia do Acre é o eixo em torno do qual giram as explorações e conclama aos magotes aqueles aventureiros de vasa moral de que lhes falei, encabeçados por meia dúzia de indivíduos que sabem, com artimanhas de todo o feitio e despudor galvanizado, fingir importância.

Em lá chegando, encontrei as explorações dessa horda, a título de autonomia:acabaram de depor o prefeito, Sr. João Cordeiro, iniciando um tremendo movimento desorganizador do governo; este movimento foi sufocado pelo Sr. Capitão Guapindaia, comandante da força federal que à frente da mesma e armado de metralhadoras, o dominou, arvorando-se com a fuga do Sr. João Cordeiro, em prefeito. Substituiu o Sr. capitão Guapindaia, no comando da força federal, o Sr. capitão Júlio Serpa, que por seu turno, se fez prefeito; recebi o governo da Prefeitura deste militar, que me acolheu sem nenhuma solenidade, nem mesmo do estilo, numa parcimônia da manifestação, que traia com clareza, o seu dissabor em se ver despojado do cargo que não era seu, como não era do seu colega antecessor.

Logo que tomei posse, este Sr. capitão Júlio Serpa exigiu o meu endosso aos atos que praticou na qualidade, que não tinha, de prefeito – e exigindo clamava em tom de gabolice – “ o povo me adora”!; protelei o endosso, examinando os papéis que eram de nomeação, substituições de cargos, de concessões, de favores; enquanto protelava, em dias que se seguiram, o Sr. capitão Serpa andava a apregoar pelas ruas, em rodas de seus amigos e conhecidos, que eu lhe havia de aprovar os atos, porque a força era ele e a ele o povo adorava. Naturalmente, tratei de observar, de indagar, de sindicar dos hábitos das autoridades e das suas relações públicas e particulares com a população e concluí, e lá toda gente vê e sabe, como eu vi e sei, que a mais desenfreada desordem reinava permanentemente entre os comandados e o comandante da força federal; os soldados indisciplinados são comparsas dos magotes políticos e tomam parte nas suas festas e são seus comensais, sendo tidos como personalidades de muito valor.

Nem se diga que os soldados figuram nessas festas e nesses banquetes apenas decorativamente, não: um soldado aqui é amigo intimo e do particular carinho de um político ali; outro soldado acolá é amigo intimo e companheiro assíduo de outro político adiante; daí a indisciplina que o próprio comandante não corrige, porque o político amigo particular do soldado intervém, cumulando o comandante de agrados e de presentes caros, de obséquios repetidos: e suborna pela bajulação. O Acre é o paraíso do soldado.

Compreendendo a situação aprovei os atos do Sr. capitão Serpa, contemporizando e procurando com jeito restabelecer o princípio de autoridade. Neste trabalho obtive a instauração de inquérito contra os soldados recalcitrantes na indisciplina e os remeti presos para o comandante da região militar, em Manaus, o Sr. coronel Rego Barros; aos soldados indisciplinados porém, este coronel não deu corrigenda alguma, caso que ocorre no Alto Juruá. No dia 14 de julho do ano próximo findo, o Sr. capitão Serpa, mancomunado com os Srs. Djalma Mendonça, juiz substituto, Carlos Gomes Rebello Horto, promotor público; João Craveiro Costa, solicitador, Borges de Aquino, solicitador, chefiando os chamados revoltosos autonomistas, que são aquele pessoal, que conhecemos, excluindo o coronel Mâncio Lima, que é homem de bem, tentou a minha deposição. O movimento, felizmente, falhou, devido as precauções que tomei, por ter conhecimento do que se tramava e pela coincidência da chegada do Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos, que, a meu pedido ao Sr. coronel Rego Barros, vinha substituir interinamente, o Sr. capitão Serpa.

O Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos foi um militar sisudo, correto e digno, mantendo sempre uma nobre linha de independência e prestigiando a minha autoridade de prefeito.

Aqueles elementos de subversão, entretanto, não desacoroçoou ante o insucesso do golpe que iam dar com a chefia do Sr. capitão Serpa, e nos dias 7 e 8 de novembro do ano próximo findo, tentaram, mais uma vez, a minha deposição; falho mais este golpe, e falhou porque o Sr. capitão Menescal de Vasconcellos, comandante interino da companhia da força federal, e o Sr, João Júlio da Silva, comandante da policia do departamento, sufocaram, com energia, o movimento.

Cooperou do seu lado pelo malogro da pseudo revolução, a chegada do Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, comandante efetivo da companhia da força federal e de seu imediato no comando, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues. Retirou-se, pois, o comandante interino, Sr. capitão Menescal de Vasconcellos.

Gorado o movimento, os seus cabecilhas, em 11 de novembro, três dias depois abandonou o departamento, e os que ficaram, temendo o justo castigo aos seus atos, impetraram ordem de ”habeas corpus” – dezoito pedidos – ao juiz de direito da comarca, dr. Lymério Celso da Trindade, que é um íntegro magistrado.

O Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, - continuou o Sr. major Pedro Avelino, -de índole autoritária e violenta, logo após a sua posse no comando, aparentou correção no cumprimento de seus deveres para com a prefeitura; à proporção, porém, que passava o tempo, se foi ele a imiscuir, e conviver com os indivíduos da amizade do Sr. capitão Serpa, e o seu companheiro de armas, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues, fez tamanha relação com o solicitador Borges de Aquino, conhecido elemento subversivo da ordem, que passou mesmo a morar em casa deste.

Deste ponto em diante a situação mostrava outras faces: eu compreendia, eu estava farto de compreender, que os tais autonomistas não passavam, nem passam de uns embaçadores, que se aproveitavam de uma falsa compostura política regional para explorar, à vontade, todos os meios de lucros, favorecendo simultaneamente, os baixos instintos da patuléia dos aventureiros inferiores e à vaidade de alguns seringueiros e a ignorância dos soldados de “pret” da força federal e o espírito autoritário dos comandantes dessas praças. Todavia, agi como me foi possível e como me aconselhava a consciência: semanas após minha chegada, verificando a existência do Lyceu Affonso Penna, estabelecimento secundário, mantido pela prefeitura e consumindo cento e quarenta contos por ano, fui visitá-lo. Nessa visita inteirei-me de que o estabelecimento não possuía o número de alunos suficiente que justificasse a sua existência, tanto que, para esconder este grave fato, mantinham curso de primeiras letras.

Feita a visita e cientificado do que sucedia, nomeei uma comissão dos Srs. Dr. José Joaquim de Oliveira, Belizário de Sousa Junior, Antônio de Salles Ferreira, e tenente Luiz Souto, todos altos funcionários da Prefeitura, a fim de inspecionar o estabelecimento sob todos os aspectos e me apresentar o relatório.

Ante este relatório, que acusava a inutilidade do estabelecimento, suspendi a função do mesmo, submetendo o meu ato ao governo federal, que o aprovou.

Originou-se deste caso a campanha de ataques e de difamações à minha administração promovida pelo solicitador Craveiro Costa, e outros professores do Lyceu, que se viram privados da pensão do governo, que recebiam sob pretexto do exercício do magistério, sendo estes cavalheiros membros da Associação Comercial de Cruzeiro do Sul, fizeram desta uma das suas melhores armas contra mim. Foi uma campanha tenaz, sistemática, aproveitando todos os precedentes da administração da prefeitura com os meus antecessores, captando solidariedade da força federal por meio de adulações, presentes ao comandante, aos soldados, campanha que fazia a sua tecla mais alta, para efeitos de descrédito da conduta do ex-prefeito Sr. coronel João Cordeiro, meu antecessor, que, como é sabido, dos quatrocentos contos de réis da verba “material”, do exercício de 1910, apenas aplicou ao departamento do Alto Juruá, cento e tantos contos, conforme consta da escrituração arquivada na prefeitura.

Assim correram os acontecimentos até o dia 2 de dezembro do ano próximo findo, quando o Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, iniciou uma espécie de impertinência, enviando, a qualquer propósito, ofícios em termos insólitos à minha pessoa na qualidade de prefeito, até que ousou, finalmente, alegando a instauração de inquérito, exigir que lhe mandasse apresentar o comandante da policia da prefeitura, sob pena (isto ele fizera constar nos pontos de palestra, para que me chegasse ao conhecimento), sob pena do comandante comparecer à sua presença ainda que arrastado.

Era demais, e como não desejasse eu entrar em luta, porquanto possuía só vinte homens, ao passo que ele possuía oitenta, bem armados e municiados, alem das metralhadores assestadas provocantemente para o edifício da prefeitura, resolvi no dia 5 de dezembro enviar a ele, Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, por intermédio do juiz de direito e do Sr, coronel Félix Fleury, um ofício comunicando-lhe que me sentindo desautorado, retirava-me do Cruzeiro do Sul, abandonando o cargo de prefeito do departamento do Alto Juruá.

No dia seguinte embarquei para Manaus, chegando a 21 de dezembro e de Manaus parti a 18 de janeiro ultimo, chegando ontem no Rio de Janeiro: o Acre odeia e repele o regímen prefeitural não de um ódio decorrente de uma serena convicção, mas o ódio preparado, fomentado por uma sinistra soborte (talvez sorte) de tenebrosos exploradores.

sábado, 4 de outubro de 2014

Agricultura irrigada
Tomislav R. Femenick – Mestre em economia e historiador.

Captar, controlar e distribuir a água com o uso de canais cavados na terra, calhas feitas de bambu ou de barro cozido, túneis, comportas de pedra, aquedutos e noras (rodas de giro vertical à qual eram presos vasos que levam a água do nível inferior ao superior), ou seja, irrigar as terras agrícolas é costume que remonta às primeiras civilizações que se tem notícia. Foi hábito na Mesopotâmia, no Egito, na China, no sudeste asiático, dos povos mediterrâneos, da meso-América, da África subsaariana e dos Andes sul americanos, entre outros. Esse sistema garantiu a sobrevivência de nações que deixaram marcas na história da humanidade. Pode-se dizer que a irrigação das lavouras foi uma dos primeiros atos econômicos da humanidade. No entanto sempre foi se não desconhecida, porém pouco praticada no nordeste brasileiro, até a primeira metade do século passado.
O historiador Raimundo Nonato tinha verdadeiro respeito pelo espírito empreendedor de José Rodrigues de Lima; industrial, comerciante, agricultor, pecuarista, salineiro, um dos fundadores do Banco de Mossoró e da Cooperativa dos Salineiros Norte Rio-grandense, dono de empresa de navegação, construtor e proprietário de imóveis. O que o professor Raimundo Nonato admirava era a capacidade que o meu avó tinha para descobrir o valor potencial de certas atividades produtivas.
No final dos anos 1930, José Rodrigues comprou cataventos novos para a sua salina e ficou com quatro sucatas sem valor de venda. Então procurou uso para os cataventos velhos. Levou os equipamentos uma das suas fazendas, localizada nas Barrocas, depois da Barragem de Baixo. Ali fez uma das suas experiências, uma das primeiras de cultura irrigada do vale do Rio Mossoró: instalando-os em série contínua e, levando a água para a região mais alta do terreno, conseguiu irrigar suas plantações de banana, mamão, laranja, cenoura, abacaxi, girassol etc., usando a queda natural que acompanhava a descida de nível. Usar catavento na agricultura não era novidade. Novo era o método. Essa sua experiência foi repassada para diversas outras pessoas, inclusive ao ex-governador Dix-sept Rosado, que a usou em seu sitio.
Outro grande inovador no processo de irrigação da agricultura no oeste foi o bispo Dom Eliseu Simões Mendes, o terceiro ocupante da diocese de Mossoró. No começo dos anos 1950, através do seu trabalho social junto às populações rurais dos vales dos rios Mossoró e Assú, Dom Eliseu – com ajuda do governo federal – implantou um programa de irrigação com o uso de motobombas movidas a motor diesel, visando produzir alimento para sustento dos pequenos agricultores, bem como excedentes para venda no mercado. Muito embora o sistema de captação de água tenha substituído os cataventos pelas motobomba, o principio de distribuição da água continuou o mesmo utilizado por José Rodrigues. Aliás, presenciei varias reuniões entre eles e o Padre Mota; este último vigário geral da Diocese, ex-prefeito e cunhado do meu avô.
Outro grande avanço da irrigação do semiárido potiguar deu-se no período de expansão da empresa Maisa, quando esta abandonou sua ideia inicial de cultivo de algaroba e passou a plantar frutas. Vários aspectos diferenciaram esse projeto dos anteriores. Entre eles a sua localização, na chapada do Apodi, longe de curso de água normal e, por isso, dependente de poços artesianos, bem como o sistema de distribuição de água com uso de pivôs rotativos.
Os pioneiros estavam no caminho certo. Segundo dados do IBGE, até agosto deste ano 59,75% da produção agrícola do Rio Grande do Norte veio da região oeste. O resto do Estado (incluindo o agreste e o leste potiguar) ficou somente com 40,25%.

Tribuna do Norte. Natal, 28 set. 2014.