terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Pirangi do Norte, final de 2013


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN , membro do IHGRN e do INRG

Daqui, da praia de Pirangi, o francês de Navarra, João Lustau, dominava esta costa até os limites com a Paraíba. Sua principal atividade era a pescaria, e de seus portos exportava para várias localidades do Brasil e do exterior. Talvez tenha chegado por aqui antes dos portugueses construírem o forte dos Reis Magos, foi poupado, e a partir de 1601 recebeu várias sesmarias. Não se sabe o nome de sua esposa, mas uma de suas filhas, Maria, casou com o português Manoel Rodrigues Pimentel, que por sua vez gerou Joana Dorneles esposa de Francisco Lopes, e daí uma larga descendência, incluindo Cipriano Lopes Galvão.

Aqui próximo, em Pium, estava sua Casa Maior, umas das famosas casas de pedra construídas pelos franceses do século XVI. Tombada pelo patrimônio e pelos depredadores, restam apenas ruínas, sem merecer nenhum destaque da Ciência, do Turismo e dos governantes. Por lá esteve Joris Garstman, pouco depois do assassinato de Jacó Rabi. Foi para lá que rumaram os sobreviventes do massacre de Cunhaú, e talvez por isso, João Lostau foi preso e depois trucidado pelos súditos de Jacó Rabi.

Mas o ano está terminando. Um século se passou que o nosso Dom Quixote, capitão José da Penha, dentro de um movimento nacional, veio combater a oligarquia da família Maranhão, que está presente no nosso Rio Grande, através de Jerônimo de Albuquerque, segundo do nome, desde a construção do forte. Mas não se combate uma oligarquia, através de outra. A família Fonseca estava nesse caminho, mas Leônidas Hermes da Fonseca não vingou porque o pai dependia dos sustentadores da nossa oligarquia.

Um novo ano vai começar. E, nesse novo ano, completará um século que o capitão e deputado cearense, José da Penha, tombou vitimado pelos aliados do Padre Cícero Romão. Já se fala, novamente, na canonização deste último, como se a santidade de um indivíduo fosse fruto de milagres alcançados pelas pessoas. O próprio Jesus dizia que a cura nascia da fé do curado.

Nada parece mudar, de verdade, de um ano para outro, através dos séculos. As novidades vêm da ciência e da tecnologia, e nada de novo vem dos seres humanos. A saúde, a educação e a segurança são os retratos do despreparo dos nossos governantes deslumbrados, que não se tocam com a realidade das coisas. Falta sensibilidade. Os cobradores de impostos continuam implacáveis. Os que estão no poder, sejam eles do executivo, legislativo ou judiciário, cuidam primeiro deles próprios. Locupletam-se com as mordomias à custa do povo. Não abrem mão de qualquer vantagem, como tem feito o Papa Francisco.

Não existe educação de fato neste país. As nossas crianças e nossos jovens não são estimulados para a liberdade e, por consequência, para o conhecimento da verdade. Muito pelo contrário, o ensino, as ideologias, as religiões, os partidos, as filosofias, e as mídias concorrem para manter o máximo de indivíduos sob domínio total. Os sistemas se alimentam da dependência dos indivíduos. Vejam o exemplo de Lula. Já está na televisão fazendo terrorismo eleitoral com o programa bolsa família. As religiões, que são criadas dia a dia, usam os pobres recursos de suas ovelhas para construir castelos de enganação e casas de milagres. Tomam contam do espaço político e midiático.

Com as cadeias em petição de miséria, escolas mal instaladas, postos de saúde de quinta categoria, anos seguidos de seca, destruindo nossa agricultura e pecuária, e desnutrindo nossas crianças, se tem o descaramento de destruir um estádio e um ginásio, e, no local, construir outro estádio pomposo, para atender a máfia internacional e a vaidade nacional. Além disso, obras iniciadas ou inauguradas são abandonadas por falta de uso ou de manutenção. O Forte foi para o IPHAN, o Presépio para o Banco do Brasil e, com certeza, a Lagoa Manoel Felipe vai para outra entidade, breve.

O calendário escolar é antecipado para atender o calendário do futebol. Até a comercialização de produtos é alterada para atender as determinações da entidade internacional do futebol.

Em 2013 o Brasil não acordou, apenas levantou sonâmbulo e saiu desvairado pelas ruas. Políticos e bandidos se aproveitaram do movimento.

Terminamos o ano sem nenhum avanço de qualidade, e vamos continuar nos entorpecendo com o futebol, os diversos tipos de bolsa, o crack e as eleições. Os partidos já estão decidindo quem são, entre eles, os candidatos que temos que escolher. Não interessa o desenvolvimento humano do país e do estado, mas simplesmente a sobrevivência deles e dos seus descendentes e aparentados. Vejam o exemplo de nossa Câmara Municipal. Seus vereadores de menos idade não se livraram das práticas dos mais antigos e repetem os mesmos erros. Anteciparam, descaradamente, a eleição da mesa diretora.

A droga (de todo tipo e natureza) ocupa os mais distantes lugares deste país e vai destruindo nossos jovens e tornando a violência uma coisa corriqueira. Os governantes não se juntam para resolver esse mal que neutraliza qualquer ação social que se programe.

Presidente Dilma, a capacidade de comprar mais coisas não melhora a qualidade de vida das pessoas. Muitas vezes piora. Sem uma educação de verdade, uma saúde de verdade e uma segurança de verdade, não vamos para canto nenhum.

Que no ano de 2014, uma onda de energia do Universo invada nossos cérebros e produza em cada um dos governantes e governados mentes mais saudáveis para que possamos viver com mais simplicidade e qualidade de vida. Que todos os governos criem Ouvidorias e Vedorias que funcionem de verdade.
Ruínas da Casa Maior de João Lostau



domingo, 29 de dezembro de 2013

FELIZ ANO NOVO!!!

"Sou mulher!
Preciso de amor.
 Não manches meu corpo
  Não desfolhes meus sentidos
   Não dilaceres meu coração
     Não despedaces meu ser."
(Jania Souza - SPVA/RN)

NADA DE LIRISMO COMEDIDO!

Beijo a tua flor com delicadeza
Como o beija-flor que beija a flor doce
Cuidadosamente, como se fosse
Zelar pela bênção da natureza.

Tua flor tem o cheiro da erva-doce
Candura de beijos no amor firmeza
Do romantismo explícito, a beleza
Que o lirismo poético pra mim trouxe.

Ser romântico hoje é piegas? Chinfrim?
O sensual poeta não pensa assim...
Vai sim cantar o amor o tempo inteiro.

Abra a porta do coração pr'ela entrar
No seu colo deixe esse seu bem sentar
Não custa nada ser um cavalheiro!

08/12/2012 - D I L S O N - NATAL/RN.
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Atenção, famílias do Assú!

Balthazar Soares, da Fazenda Curralinho, e a Baronesa de Serra Branca


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, sócio do IHGRN e do INRG
Nos estudos genealógicos de Manoel Américo de Carvalho Pita, sobre as famílias de Santana do Matos, Balthazar Soares aparece como genro do fundador de Angicos, tenente Antonio Lopes Viegas, e como sogro de Luiz da Rocha Pita, nada confirmado até agora. Encontro informações sobre um Balthazar Soares que não sei se é o mesmo.

Pelo livro de óbitos de Santana do Matos,  o cadáver de Balthazar Soares, branco,  foi sepultado aos onze de dezembro de mil oitocentos e vinte e cinco, na Matriz de Santa Ana do Mattos, falecido com a idade de oitenta e quatro anos de idade, casado que era com Isabel Maria de Figueredo; e o da sua esposa, por sua vez, foi sepultado aos vinte de janeiro de mil oitocentos e vinte e seis, na mesma matriz,  falecida com setenta e oito anos de idade.

Pelos registros acima, Balthazar deve ter nascido por volta de 1741, e D. Isabel por volta de 1748. Além desses registros, encontramos, também, assentamentos de praça de dois filhos de Balthazar, no Assú. Em tais registros não aparece a mãe dos assentados.

João Baptista Xavier, filho do capitão Balthazar Soares, natural da Freguesia do Assú, idade de 32 anos, cabelos castanhos, olhos pretos, altura 5p e 2pm, praça na 4ª Companhia em 10 de setembro de 1779, e por despacho do ilustríssimo Sr. Governador, de 26 de junho de 1806, e cumpra-se do Vedor Geral, passou para esta companhia, casado, vive de criar de gado.

Antonio da Silva Barbosa, filho de Balthazar Soares, natural, e morador nesta Ribeira do Assú, branco, solteiro, de estatura baixa, dentes grandes, olhos pequenos, e azuis, nariz grande, sem barba, de idade de dezesseis anos, assenta praça em revista de vinte e sete de Julho de 1789.

Encontramos mais uma referência ao capitão Balthazar em  um “Diário Oficial da União” de 1906, de onde extraímos trechos que o capitão Absalão Fernandes da Silva Bacilon, juiz distrital em exercício da Vila de Santana do Mattos, da comarca do Assú, escreveu: Faço saber aos que o presente edital, com o prazo de 90 dias virem, que, por parte de D. Belisária Wanderley de Carvalho e Silva, baronesa de Serra Branca, me foi dirigida a petição do teor seguinte: Cidadão juiz distrital, em exercício, da Vila de Santana do Matos. A baronesa de Serra Branca, D. Belisária Wanderley de Carvalho e Silva, viúva e ora residente na cidade do Assú, sede desta comarca, diz, por seu procurador e advogado, abaixo assinado: que é senhora e possuidora de uma data ou lote de terras na serra de Santana, deste distrito, e na parte a que ora dão os nomes de Pelado e Lagoinha; que a extensão superficial da área desta terra, conforme a respectiva concessão, é de uma légua de largura sobre três de comprimento, pegando de um olho de água que ali se acha em um riacho, denominado Caiçarinha, que deságua para parte do Assú; que a dita terra estende-se na chapada daquela serra, e tem sido cultivada e possuída, delimitando-se, ao norte, pelas sinuosidades desta mesma serra e quebra das águas, como vulgarmente se diz, ficando neste lado a antiga fazenda Curralinho de Balthazar Soares; limita-se, no sul, com terras da fazenda do riacho  da Areia, que foi do capitão-mor Cypriano Lopes Galvão, ao poente, com terras que foram do capitão Felix Gomes Pequeno, e ao nascente com terras da ribeira do Putegy, onde atualmente está o sítio Bodó e outros, que tendo a suplicante por si e seus antecessores uma posse de longíssimo tempo, se não imemorial, pela povoação e cultura constantes das ditas terras, há menos de um ano, os confrontantes Joaquim Bezerra, viúvo e morador em S. Bento, Antonio Florêncio, morador em Cipós de Leite, João Lopes de Araújo Galvão, morador em Areia ou Furna da Onça e as mulheres destes, cujos nomes a suplicante ignora, bem como Miguel Rodrigues e sua mulher D. Francisca, Antonio Hermógenes e sua mulher D. Constância, e o cidadão Cícero Rodrigues, moradores no lugar Catunda e todos no vizinho distrito de Currais Novos, têm feitos roçados e picadas nos matos dos terrenos sempre possuídos e cultivados pela suplicante e seus antecessores, sob o pretexto de uma linha novamente tirada entre este município e aquele de Currais Novos ter apanhado pequena parte dos mesmos terrenos.
Continuando, mais adiante, a baronesa justifica: A referida terra foi pedida em 1764 por D. Adriana de Hollanda Vasconcellos, e não tendo voltado de Portugal esse pedido com a confirmação, o tenente-coronel Francisco de Souza e Oliveira, em 1804, requereu e lhe foi concedida a mencionada terra por data da sesmaria, com três léguas de cumprimento e uma de largura, tendo o ponto de partida e limites acima descritos; em 1822 o capitão Felix Gomes Pequeno que já havia comprado a mesma terra ao dito donatário, requereu a certidão daquela data pra realizar a sua propriedade.

Adquirindo esta mesma terra o capitão Felix Gomes Pequeno, pela forma por que ficou dito, em 1810 a vendeu ao capitão Antonio da Silva de Carvalho, e esta venda foi ratificada pelos herdeiros do mesmo capitão Felix Gomes, por escritura pública passada em 22 de julho de 1858, com tudo se vê do documento.

Por morte dos sogros da suplicante, o mesmo capitão Antonio da Silva de Carvalho e sua mulher, D. Maria da Silva Veloso, passou essa terra aos seus herdeiros, um dos quais era o falecido marido da suplicante, Felipe Nery de Carvalho e Silva, barão de Serra Branca, e este comprando as partes dos demais, ficou possuindo toda aquela terra.

Falecendo o barão de Serra Branca, sem herdeiros necessários, a suplicante sucedeu-lhe no todo da herança dos bens por ele deixado, não só por sua meação como por ter sido instituída, em testamento, sua herdeira universal, e por isso hoje lhe pertence exclusivamente a terra de que se trata e cuja demarcação ora se requer.

Em “Velhos Inventários do Seridó”, Olavo de Medeiros Filho, tratando do inventário de D. Adriana de Holanda e Vasconcelos, que foi casada com Cipriano Lopes Galvão, Felix Gomes Pequeno e Antonio da Silva e Souza, cita, também, como confrontante da Data de Terra, na Serra de Santa Ana, o capitão Balthazar Soares da Silva, do sítio denominado Curralinho.

Quem sabe mais alguma coisa sobre Balthazar Soares?


terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Postado dia 08/05/2013 às 18h00 - Jornal de Hoje

A história dos esquecidos

Carta de Paulo Araújo, direto do sítio da sua infância, no Totoró, para falar sobre o livro ‘Grandes Personagens do…

Carta de Paulo Araújo, direto do sítio da sua infância, no Totoró, para falar sobre o livro ‘Grandes Personagens do Sertão – a história dos esquecidos pela história, de Noélia de Oliveira que durante anos e anos andou por aquele mundo do sertão do Seridó. A carta de Paulinho é de um que não precisa acertar contas com o povo e a terra que conhece tão bem.

Serejo,
Saiu um livraço sobre o povo, a cultura, a riqueza do Seridó: “Grandes Personagens do Sertão – A História dos Esquecidos pela História (Ed. Travessia, R$ 20,00), de Francisca Noélia de Oliveira, uma professora que durante 26 anos trabalhou como extensionista rural da Emater percorrendo as comunidades rurais de Currais Novos.
Trata-se daqueles textos deliciosos, sem qualquer pretensão acadêmica, recheado de sabedoria de quem escreve sobre o que viveu. Graças a Senhora Santana Noélia escreveu e publicou esse livro que lemos de uma sentada só (ou melhor, de uma deitada só numa rede, de preferência embaixo de um alpendre, como tive o prazer de fazer no último sábado).
Para além de ser um acerto de contas da autora com as suas memórias pessoais – e nós escrevemos principalmente para ir “em busca do tempo perdido”, como fez o francês Marcel Proust – “Grandes Personagens do Sertão” é um hino de amor ao Seridó, sua gente, seus costumes e sua história (com “h” minúsculo, pois a autora, acertamentadamente, fez a opção de se debruçar, de novo como os franceses da “Nova História”, sobre o cotidiano e a vida privada dos anômimos.
Dividido em três partes (Personagens e Coisas do Sertão; Poemas; e Ditos, Provérbios e Bençãos), o “Livro de Noélia”, como está se tornando conhecido por toda a gente em Currais Novos, terá lançamento oficial durante a Festa de Santana, no mês de julho próximo, mas o sucesso e a propaganda boca-a-boca certamente fará a autora esgotar a tirarem inicial de 500 exemplares rapidamente.
A saga da publicação do livro é um capítulo a parte. Vítima da falta de financiamento público ou particular, a autora fez um empréstimo bancário e encontrou, numa sobrinha que mora em Manaus e tem uma editora, o caminho mais fácil para ver impresso suas letras. Quantos escritores não “morrem na praia” nesse cenário onde é mais vantajoso financiar shows de bandas de forró de mau-gosto? Graças a Deus Noélia foi em frente e nos brindou com essa maravilha de livro!
Não dá pra dizer, daqui pra frente, que sabemos algo sobre o Seridó sem ler “Grandes Personagens…” Se para o escritor Oswaldo Lamartine, o especialista por excelência sobre o Seridó, essa região do Rio Grande do Norte “foi o que nos restou de civilização”, Noélia vem agora mostrar, por meio de histórias do cotidiano recolhidas no seio da sua família de origem rural, entremeadas por outras aprendidas nas suas andanças como extensionista pelos velhos sítios e fazendas, que estamos num lugar onde nunca houve, de fato, espaço para a barbárie.
Vamos ao conteúdo: imagine o que era viver no sertão entre a virada do século 19 até meados dos anos 90. Noélia nos conta, numa linguagem simples, gostosa de ler, detonadora daquele sentimento de saudade e constatação de “que era assim mesmo”, como eram os costumes, o modo de viver, a moda, a culinária, as crendices populares, o peso da religião, os embates sociais entre ricos e pobres e principalmente o amor que nós, os sertanejos, temos pela Mãe Terra.
Veja esse trecho, que belo: “Mexer com a terra, sentir o cheiro de terra molhada, colocar sementes e entupi-la com os pés, cuidá-la, adubá-la com carinho e depois colher seus frutos. Essa é a maior alegria e riqueza dos agricultores. (…) A terra é tão importante que te dá a vida e te acolhe na morte, te guardando em seu seio, para a eternidade”. Antes de ser moda, a ecologia já fazia parte da vida de Noélia.
Meu primeiro contato com a autora se deu no início dos anos 1980. Ela chegava na zona rural onde morávamos falando de igual para igual com todos. Montou um grupo de jovens em companhia da sua colega Marluce Soares e ensinou aos jovens a forma correta de lidar com a terra, fazê-la produzir mais. Às nossas mães, ensinou receitas fabulosas de doces caseiros – muitas das quais fez a fama da minha mãe, Dona Branca, ultrapassar divisas estaduais nesse Brasilzão. Isso não está dito no livro, pois a modéstia é uma das suas características. Mas é como se estivesse. Faz muita falta, hoje, na zona rural, figuras como Marluce e Noélia, que eram nossas grandes referências de sabedoria em busca de dias melhores – como chegaram.
Até hoje. Apesar de todas as facilidades trazidas pelos programas sociais, perdeu-se uma coisa que aquelas duas moças nos ensinaram: orgulho de ser “do sítio”. O livro, de certa forma, vem resgatar isso e deve ser, obrigatoriamente, objeto de leitura em todas as nossas escolas.
Voltando ao conteúdo, em textos curtos, que formam sub-capítulos independentes dentro dos três principais e podem ser lidos ao nosso bel prazer, é possível saber, por exemplo, que nas fazendas do Seridó as únicas coisas que precisávamos comprar eram pó de café, querosene para as lamparinas, fósforo e tecido para fazer roupas. Todo o restante produzíamos em casa, desde o sabão, a vassoura, os móveis, até o domínio das técnicas de conservação de alimentos como a carne e o queijo. Pode parecer pouco, mas na Europa Feudal isso não mais existia.
O Seridó era, e continua sendo, um mundo civilizado, bem longe das franjas o mar, com um sistema de justiça próprio, onde não havia lugar para mentiras e a palavra dada valia mais do que a letra lavrada. A separação entre o mundo dos adultos e das crianças, as brincadeiras junto à natureza, a descoberta do sexo, o respeito aos mais velhos, os ritos da vida e da morte, a geografia das casas e condução do lar aparecem no livro como se entremeado pelas anedotas, as histórias engraçadas, os apelidos que as pessoas colocavam nas outras e as chamadas pilérias (brincadeiras que até hoje funcionam como um código próprio, entre os seridoenses, quando alguém quer falar algo em privado).
Pois então, quando você passar por Currais Novos agora procure, na Papelaria A Mina de Ouro, o livro “Grandes Personagens do Sertão”, de Francisca Noélia de Oliveira.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013



O Movimento judaico-português durante o domínio holandês no nordeste

Em 1549 a Coroa Portuguesa nomeou para o Brasil um Governador Geral, tendo como sede deste governo a Bahia, capital da nova terra.
Até então a Inquisição Portuguesa não havia sido introduzida no Brasil. Mas, devido ao grande número de marranos e cristãos novos, Portugal outorgava em 1580 poderes inquisitoriais ao bispo da Bahia. Os jesuítas foram autorizados a auxiliar os bispos no preparo de processar os heréticos e extraditar os acusados para os tribunais da Inquisição em Lisboa.
Também no ano de 1580 foi feita a unificação de Portugal e Espanha, e por toda a parte da Península Ibérica foram intensificadas as atividades da Inquisição.
Finalmente, em o dia 28 de Março de 1591, foi nomeado pela Corte Portuguesa o Sr. Heitor Furtado de Mendonça como visitador oficial da Inquisição de S. Tomé, Cabo Verde, Brasil e S. Vicente (mais tarde, Rio de Janeiro).
O visitador Mendonça chegou à Bahia em 9 de Junho de 1591, onde nomeou uma comissão inquisitorial; publicou um Auto-de-Fé, uma carta monitória e um termo de graça para a cidade da Bahia e seus arredores num raio de uma légua. Os objetivos desta visitação incluíam não apenas a perseguição aos judeus e judaizantes, como também a descoberta de práticas sexuais contra a natureza, bruxaria e insulto à Igreja Católica. Os judeus que professavam a fé católica, mas que observavam ritos e costumes judaicos eram a presa mais importante desta busca.
Visitação do Santo Ofício em Pernambuco em 1593-95.
Heitor Furtado de Mendonça chegou finalmente em Recife no dia 21 de Setembro de 1593, estabelecendo lá uma comissão inquisitorial. As comunidades de judeus marranos e cristãos novos incluindo muitos cripto-judeus eram bem representativos nesta capitania, devido à inquisição destes colonos juntamente com Fernando de Noronha, o responsável pela introdução do cultivo de cana-de-açúcar e engenhos para a produção de açúcar em escala industrial para exportação.
O primeiro processo no Estado de Pernambuco foi contra Diogo Dias Fernandes e sua mulher, marranos brasileiros, que possuíam uma Torá (Rolo dos Livros do Pentateuco). Esta família freqüentava a sinagoga de Camaragibe, localizada na fazenda de Bento Dias Santiago, onde se reuniam os judaizantes de Pernambuco.
Mas o decreto datado de 4 de Abril de 1601 cancelava o decreto de 27 de Janeiro de 1587 que proibia os judeus portugueses de saírem de Portugal e venderem suas propriedades sem permissão. Já no começo de 1605 o rei obteve perdão geral do papa, válido por um ano e abrangia todos os cristãos novos e suas transgressões passadas. O preço deste ato veio mencionado na patente real de 1º de Fevereiro de 1605 e é equivalente a 1.700.000 cruzados em dinheiro, mas a condição do débito do tesouro real num montante de 225.000 cruzados pelos descendentes dos cristãos novos da Nação Hebréia em Portugal.
De conformidade com as condições do acordo, os tribunais inquisitoriais portugueses puseram em liberdade 410 prisioneiros (entre eles, os brasileiros, Ana Alcoforada Brites da Costa e Ana da Costa), aos quais foi reposto apenas uma pena formal (1).
Assim, um grande êxodo de cristãos-novos
deixou Portugal e veio para o Brasil estabelecendo-se nos Estados da Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro.
Como já foi mencionado anteriormente, milhares de judeus portugueses e espanhóis imigraram também para a Holanda. O motivo da escolha era a maior liberdade de crença e culto ali permitido.
Muitos judeus cristãos-novos e marranos brasileiros mantinham contatos pessoais e relações comerciais com os judeus de Amsterdã.
O Tratado de Utrecht em 1579 estipulava que pessoa alguma, no território da Holanda seria perseguido por motivo de suas convicções ou práticas religiosos. Assim, muitos judeus não só de Portugal e Espanha, mas também da Antuérpia e França imigraram para a Holanda.
A vida cultural e religiosa desses judeus floresceu rapidamente. Fundaram na Holanda três congregações: Beth Jacob, Neweh Shalom e Beth Israel, bem como uma Escola Talmúdica de Torah e um Colégio Ets Hayim.
Amsterdã conseguiu dois rabinos, Menasseh ben Israel e Isaac Aboab da Fonseca. Ambos tinham sido católicos (de famílias marranas) e foram os primeiros a receberem educação rabínica em Amsterdã.
Este último imigrou para Recife e foi conhecido mais tarde como o primeiro rabino a fundar a Congregação Tsur Israel (Rocha de Israel).
A conquista da Bahia pelos holandeses ocorreu no dia 8 de Maio de 1624. A expedição era composta de 26 navios armados de 450 canhões e tripulados for 3.300 homens sob o comando do Almirante Jacob Willekens e do vice Peter Heyn.
Os holandeses proclamaram imediatamente sua política de tolerância religiosa e ofereceram proteção aos residentes da cidade, ganhando assim, apoio da população local, em especial dos marranos, que detinham o poder econômico pelo cultivo e dos engenhos de cana-de-açúcar.
Ao contrário dessa outorga de tolerância religiosa, os holandeses ordenam que os jesuítas fossem expulsos e seus conventos fechados. Ao mesmo tempo, declarava-se que a Igreja Cristã Reformada, de origem protestante, fosse representada como a religião do Estado. Assim, milhares de marranos, agora numa situação privilegiada uniram-se à Expedição Holandesa de 1629, que (como já frisei anteriormente) era composta por 56 navios com 1.170 canhões e marinheiros. Auxiliados por um judeu chamado Antônio Dias Paparobalos, que por muitos anos fora comerciante em Pernambuco antes de partir para a Holanda; serviu ao desembarque das forças expedicionárias holandesas como guia principal naquele território. No dia 14 de Fevereiro de 1630, Recife estava sob domínio dos holandeses.
Para os judeus marranos e cristãos novos parecia-lhes estar num paraíso, onde as regras da Inquisição não mais ali prevaleciam.
Fez-se destacar o Goverador-Geral do Brasil-Holandês, João Maurício de Nassau, que durante seu bem sucedido governo, motivou muitos judeus portugueses e holandeses a imigrarem para o Brasil. Como exemplo, em 1638 Manuel Mendes da Costa chefiava um grupo de duzentos jovens que vieram em dois navios da Holanda para o Brasil. No meio dele havia classe de elite, os letrados, doutores e líderes espirituais.
A trégua de Aliança defensiva entre Portugal e Holanda para lutarem contra a Espanha, beneficiou ainda mais a imigração de marranos, quer de Portugal, quer da Holanda.
Várias fazendas de engenhos açucareiros pertenciam a judeus, onde instalavam suas sinagogas nas próprias fazendas, como destacamos do livro “Senhores de Engenho – Judeus em Pernambuco Colonial 1542-1654” – de José Alexandre Ribemboim:
- Diogo Fernandes e Branca Dias. Engenho de Camaragibe-PE.
- Ambrósio Fernandes Brandão. Engenho de Inobi.
- David Senior Coronel (Duarte Saraiva). Engenho Bom Jesus.
- Moisés Navarro. Engenho de Juriçaca – Cabo.
- Matheus da Costa. Engenho de João Tenório Medina – Ipojuca.
- Abraham Izhach. Ferreiro-PE.
- André Gomes Pina. Engenho de Muribara
- Antônio Barbalho Pinto. Engenho de Tibirí .
- Baltazar Rodrigues Mendes. Engenho de Embiapecu.
- Duarte Nunes. Engenho de Cacáu.
- Fernão do Vale. Engenho S. Bartolomeu.
- James Lopes da Costa. Engenho na Várzea do Capiberibe.
- Estevão Ribeiro, Fernão Soares, Filipe Diniz da Paz, Francisco Pardo e muitos outros.
Vários outros proprietários eram Jacob Valvende, Moses Neto, Jacob Zaculto, João Lafará, Gil Correia, Gabriel Castanha, Gaspar Francisco da Costa, Atias Avraham Açevedo, Fernão Martins, David Atias, Benjamim de Pina, etc.
Findando o domínio holandês em 1654, volta o domínio de Portugal e, conseqüentemente, os processos inquisitoriais.
A propósito, com o término do domínio holandês, os judeus marranos e cristãos novos tomaram diferentes rumos:
- Uma boa parte voltou para Holanda (este será abordado no próximo capítulo).
- Uma outra boa parte foi para o Caribe e América. Lá reforçaram a fundar a cidade de Nova Amsterdã, hoje Nova York. Prova disto é que no Cemitério da Congregação Shearíth Israel, há o túmulo de Benjamim Bueno Mesquita que deixou o Brasil em 26 de Janeiro de 1654, embarcando com outros jovens no navio Volk rumo a Martinica, indo mais tarde morrer com seu filho Joseph Bueno em New Bower. Pouco depois de haver chegado a Nova York, faleceu e foi enterrado.
- Outra grande parte permaneceu no Brasil imigrando-se mais para o Sudeste, especialmente para Minas Gerais, onde iniciava o Ciclo de Ouro em Itaberaba, Ouro Preto, Mariana, Ponte Nova. O resultado foi uma imigração em massa para a região de Minas Gerais, Parecida, na opinião de Arnold Wiznitzer, com o que se realizou na Califórnia cento e cinqüenta anos mais tarde. Por isso, o Estado de Minas Gerais passou a ser o centro de maior concentração de judeus portugueses, marranos e cristãos novos. Construindo caminho pelo Rio de Janeiro, dirigiam-se para as montanhas de Minas Gerais, onde se encontravam mais distantes dos grandes centros inquisitoriais e mais seguros para criarem seus filhos explorando o comércio do ouro e das pedras preciosas.
Os processos inquisitoriais não paravam. Abaixo encontramos uma lista de judeus brasileiros que foram executados pela Inquisição em Lisboa – no período de 1644-1748.
Auto-de-fé Nomes Dossiê
· 10 de julho, 1664 Gaspar Gomes 5019
· 15 de dez., 1647 José de Lins (Isaac de Castro) 11550
· 14 de julho, 1686 Theotônio da Costa 2816
· 30 de julho, 1709 Rodrigo Alvares 999
· 14 de outubro, 1714 João Dique de Sousa 10139
· 16 de nov., 1720 Theresa Pais de Jesus 2218
· 16 de out., 1729 João Thomas de Castro 9999
· 17 de junho, 1731 Felix Nunes de Miranda 2293
Miguel de Mendonça Valladolid 9973
Guiomar Nunes 11772
· 6 de julho, 1732 Diogo Correia do Vale 821
Domingo Nunes 1779
Luiz Miguel Correia 9249
· 20 de set., 1733 Fernando Henriques Alvares 8172
· 1 de set., 1737 Manoel da Costa Ribeiro 1361
· 18 de out., 1739 Luiz Mendes de Sá 8015
Antônio José da Silva 3464
· 20 de out., 1748 João Henriques 8378
(Todos esses dossiês se acham no Arquivo da Torre do Tombo em Lisboa).
Após o domínio holandês no Brasil, o autor A. Wiznitzer, ainda relata no livro citado o seguinte sobre os judeus que permaneceram no Brasil: “Todas as pessoas, tanto cristãos como judeus, as quais, devido ao atraso dos navios onde deviam embarcar, não tivessem partido dentro dos três meses de acordo, seriam tratados como até o presente o tinham sido, excetuando os judeus outrora cristãos, estando estes sujeitos, como estavam, à Santa Inquisição, na qual não posso interferir. Qualquer judeu que não tivesse sido batizado católico poderia permanecer no Brasil sem correr o risco de ser molestado ou perseguido. Antigos marranos de descendência espanhola e portuguesa, que abertamente tinham abraçado o judaísmo, formavam a grande maioria da população judaica do Brasil-Holandês; mas seus filhos, nascidos judeus, ou antes ou depois da emigração de seus pais para o Brasil, não podiam ser considerados heréticos pela Inquisição. Conseqüentemente, não seriam molestados, caso optassem pela permanência no Brasil”.
Outrossim, o referido autor ainda relata em seu livro que, “em 1964, descobriram-se no Brasil as minas de ouro de Itaberaba. Seguiu-se a descoberta de minas adicionais em Ouro Preto e muitos outros lugares. O resultado foi uma migração em massa para a região de Minas, parecida com a que se realizaria na Califórnia cento e cinqüenta anos mais tarde. Brancos, negros, mulatos, índios; homens e mulheres, jovens e velhos; os ricos, os pobres, os nobres e os plebeus, clérigos e leigos; estrangeiros com ou sem passaporte – todos se precipitaram para a região aurífera. A multidão abrangia, naturalmente, um grande número de cristão-novos, e entre esses havia judaizantes que, quando descobertos, eram denunciados, presos e entregues à Inquisição de Lisboa”.
(1) Arnoldo Wiznitzer – Os Judeus no Brasil Colonial pág. 28.
Autor: Marcelo M. Guimarães
Engenheiro Industrial, pós-graduado em Engenharia Econômica com MBA em Finanças. Escritor, Teólogo e Conferencista. Fundador da ABRADJIN (Associação Brasileira dos Descendentes de Judeus da Inquisição), e do primeiro Museu da História da Inquisição no Brasil.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Fonte: transcrito do blog de Ormuz Simonetti.

REMINISCÊNCIAS DA RUA PRINCESA ISABEL – A SAGA DE FLORIANO “EL BODEGUERO”. ÚLTIMA PARTE.


Em uma noite do mês junho de 1972, despedi-me da turma da Princesa Isabel, dos meus amigos do Atheneu, da minha cidade de Natal, e rumei para São Paulo onde iria assumir no Banco do Brasil, o que seria o meu primeiro emprego.

Pouco me recordo daquela última semana passada junto com essa turma. A expectativa de viver e trabalhar em outra cidade, não me deixava pensar em mais nada. O foco era a viagem. O desconhecido me assustava, ao tempo que também me atraia. Como seria morar sozinho? O que me esperava naquela cidade grande? A verdade é que eu pouco conhecia além das fronteiras de minha cidade, já que meu vôo fora de Natal tinha apenas  conseguido alcançar as cidades de João Pessoa, com os pic-nic do professor Humberto do Atheneu, que de tanto fazer esse tipo de viajem, terminou recebendo o apelido de “Humberto Pic-nic” e a cidade do Recife, onde fui assistir o casamento de um primo.

Hoje escrevendo essas crônicas, vagas lembranças fragmentadas daquela época, chegam-me à memória como fleches daqueles últimos dias que antecederam a minha viagem a São Paulo. Recordo que saímos pelos bares da vida, tomamos umas cervejas e, como de costume, tudo terminou em serenatas.

Ao retornar nos anos seguintes, o tempo era curto para dividi-lo entre os familiares e os velhos amigos. E como sequência natural das coisas, cada um foi tomando o seu rumo pela vida. Uns mudaram-se para outros estados, outros para ruas mais afastadas e lá formaram novas turmas. O ensino superior, outra fase importante na vida dos jovens, obrigatoriamente abriria espaço para a convivência com novos amigos que estudariam e se divertiriam juntos.
      
      Quando deixei Natal em 1972, a turma de frequentadores da “Bodega de Floriano” já estava se dissipando. Faço aqui uma retrospectiva dos que me chegam à memória e as profissões que abraçaram pela vida: Jairo (engenheiro); Adauto (advogado e escritor); Levi (artista plástico); Jaime Ninho (economista); Adilson Gurgel (advogado); Hamilton Gurgel (bancário); Chiquinho (serviços de telecomunicação); Leonardo Naná (engenheiro); Rominho (comerciante); Leo Leite (matemático); Gilson Leite (bancário); Beto Coronado (psicólogo e professor); Zé Ivo (odontólogo); Jorge Chopp (médico); João Bosco (professor universitário); Cacá (pintor), Paulinho (médico); Alberto (engenheiro); Carlos Castim (advogado) e Thales (engenheiro), todos morando atualmente em Natal.
Barroca, Carlinhos, Mario Maromba e Sérgio China faleceram. Josemar (odontólogo) mora em (Brasília; Zezé (bancário) mora em Caruaru-Pe; Maninho mora em Maceió; Túlio e Calabé moram em Recife.

Quanto a essas reuniões, tudo começou quando no final da década de 80, por ocasião das festividades natalinas, Beto e Jairo se encontraram e, pela primeira vez, trataram do assunto. Comentaram sobre a possibilidade de reunir alguns componentes da turma, para uma confraternização na época natalina. Dez anos depois, em 1999, meia dúzia dos amigos daquela época reuniu-se no hotel Barreira Rocha para um almoço de reencontro. Aquele almoço seria o pontapé inicial para a sucessão ininterruptas dessas reuniões, que no próximo sábado completam 15 anos.

Nesse dia faremos uma homenagem especial ao nosso patrono Floriano, proprietário da bodega, que deu nome a nossa confraria, onde essa e outras turmas no passado se reuniam diariamente para conversar, fazer amigos e beber na fonte do conhecimento de um dos bodegueiros mais festejados e admirados de nossa cidade.

Viva Floriano “El Bodegero”! 


quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

A morte de D. Altina, esposa de José da Penha
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, sócio do IHGRN e do INRG
Cem anos atrás, o capitão José da Penha incendiou este Rio Grande do Norte com suas palavras flamejantes. Mas antes disso, o capitão mais atrevido das nossas forças armadas se envolveu em outros episódios de luta. As críticas que pronunciou sobre o morticínio em Fortaleza, no dia 3 de janeiro de 1904, acabaram gerando sua prisão. No jornal “A Província” de Pernambuco encontramos o relato da morte de D. Altina, no Forte do Brum.
Preso na fortaleza do Brum desde o dia 18 de dezembro último (1904), o alferes do 17º batalhão José da Penha Alves de Sousa, foi ontem ao anoitecer ferido por um dolorosíssimo golpe.
Esse distinto oficial, que veio do Ceará sem nota de culpa aguardar aqui deliberação do marechal ministro da guerra, a cuja ordem se acha preso, trouxe consigo a sua esposa Altina Alves de Sousa, senhora assaz formosa, ornada de belos dotes de coração e de espírito e extremosamente dedicada ao marido e à duas filhinhas que constituíam a alegria e a consolação do casal através da vida forasteira e acidentada que constitui quase sempre a carreira militar.
O alferes José da Penha, por sua vez, nutria pela família um afeto extremo e um desvelo a toda prova, de sorte que, fossem quais fossem as atribulações da existência, havia de reinar entre eles uma felicidade relativa, a felicidade do lar pelo menos.
No entanto, D. Altina, senhora altamente impressionável, não estava satisfeita; não por si, mas por julgar-se um obstáculo à carreira do marido. Daí a tresloucada ideia do suicídio que a assaltou, ideia que por mais de uma vez pretendeu levar a efeito, conseguindo fazê-lo afinal ontem (9 de janeiro de 1905) às seis e meia horas da noite.
De nada valeram as prevenções e as cautelas do alferes José da Penha e da criada Damiana, uma criada de rara dedicação que acompanhava D. Altina desde a infância.
A desventurada senhora, não se sabe como, conseguiu uma cápsula para o revólver que o marido tinha o cuidado de trazer sempre descarregado e fechado na mala, e, ontem à citada hora, apoderando-se da arma, carregou-a e disparou-a contra a têmpora direita.
Ao estampido, o alferes José da Penha, que tomava café da parte de fora com dois outros oficiais, correu, como muitas outras pessoas, para o ponto de onde ele partira – um compartimento de tabique situado a um canto da sala cedida ao casal. Ali deparou, preso do mais doloroso assombro, uma cena desoladora. A esposa jazia por terra, insensível e banhada em sangue; a morte fora instantânea.
A inditosa moça desprendera-se da vida sem uma contração de agonia, sem um traço de amargura no rosto e, quando mais tarde a vimos naquela mesma sala, então transformada em uma câmara mortuária, parecia mais uma criatura serenamente adormecida de que um cadáver. Apenas traziam à ideia o tristíssimo sucesso algumas manchas vermelhas sobressaindo nas ataduras brancas que abraçavam a cabeça da morta.
- Logo que teve conhecimento do fato o general Serra Martins compareceu a aquela praça de armas e providenciou para que se iniciassem imediatamente os competentes inquéritos: militar e civil. Neste intuito comunicou o ocorrido ao Dr. Chefe de polícia que fez seguir para ali o Dr. Glycério Gouveia, delegado do 1º distrito. Além desta autoridade compareceu também o Dr. Souza Paraízo, delegado do 2º distrito.
Entre os muitos oficiais que foram à fortaleza do Brum enquanto lá estivemos, notamos os tenentes coronéis Alberto Gavião e Eduardo Silva.
Reinava geral desolação entre as pessoas ali reunidas, desolação a que nos associamos, apresentando condolências ao brioso oficial.
Dois dias depois da publicação acima, o alferes escreveu para a redação.
Senhor redator: - De par com os meus agradecimentos pela tocante e carinhosa notícia do inesquecível sucesso do dia 9, aceitai uma breve explicação, a que não posso renunciar.
Afirmaste que era minha desventurada esposa, altamente impressionável, conjeturando-se um obstáculo à minha carreira do que lhe advieram tendências para suicidar-se. Consente-me que vos ministre mais acertados informes.
Desgraçadamente mais do que pura impressionabilidade, comandam o corpo e o espírito as prepotências da alienação mental, que a martirizaram três vezes no curto lapso de oito anos. De cada uma, conforme fosse o delírio ou a mania, deixava ou não de ter, consoante a lei que preside ao desdobrar daquela triste moléstia, as impulsões suicidas, o que lhes servem de instrumento os objetos mais inconcebíveis, confirmam todos os profissionais, de qualquer procedência ou escola.
Cessada a causa dessa obstinação intraduzível, que fazem somente ideia pouquíssimas pessoas, o que mais torturava aquela alma de santa, era justamente o horror de suas “criminosas tentativas”, como lhes chamava ela.
Repugnava-lhe às crenças religiosas, restauradas nos momentos de trégua, achar desculpa, mesmo estando alienada, para quem atentava contra a própria vida. E quando de fato se restabelecia de todo, transpunha os limites do normal o seu desejo de viver para os nossos filhos. E os modestos incitamentos, com que me impelia à conquista do seu mais forte ideal – um nome para seu esposo, adquirido na luta pela justiça e pela liberdade, - ultrapassavam identicamente a zona, em que se agitam as fragilidades comuns à maioria das pessoas do seu sexo.
Tanto assim, que o meu derradeiro tributo à  sua alma, será imolar-me sempre quando for oportuno, aos meus ideais, em que apoia minha consciência de crente e homem livre.
Reiterando meus comovidos agradecimentos, subscrevo-me vosso patrício e admirador. J. da Penha.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

POR AI: CARNAÚBA DOS DANTAS

Posted by Lúcia Rocha

Por Lúcia Rocha 
JornalistaPublicado na Revista Presença, de outubro de 2013.


Monte do Galo

       O Brasil é um país de dimensões continentais. São muitos estados, muitas cidades que caberiam em alguns países. Conheço o Brasil de ponta a ponta, fazendo as contas, em torno de dez por cento dos municípios brasileiros, que totalizam mais de cinco mil.
       Mas o meu Rio Grande do Norte surpreende, cada vez que conheço alguma nova cidade. Há pouquíssimo tempo conheci a região Seridó: Caicó, Currais Novos e Carnaúba dos Dantas. Essa última surpreendeu-me. Situada entre Acari e Jardim do Seridó, Carnaúba dos Dantas é uma cidade pequena, talvez um terço de Tibau, com uma população em torno de sete mil habitantes, um clima ameno, nem muito calor, nem muito frio, cercada de serras, uma paisagem encantadora. Rica em paisagens naturais. As pessoas sentam-se ainda na calçada, livres de qualquer perigo. A natureza se encarregou de deixá-la bonita, pois para onde a gente se vira, eis uma serra e o Monte do Galo, uma atração turístico-religiosa, com direito a capelinha lá no alto.



Praça Caetano Dantas


       Carnaúba dos Dantas tem uma praça no centro, que lembra a Praça de Convivência de Mossoró, com quiosques e barzinhos, movimentados nos finais de semana. Num domingo, houve bingo à tarde, entrando pela noite, que lotou o espaço. Gente da zona rural chegando de pau de arara, cada um com seu taborete ou cadeira. A cidade fundada pelo português Caetano Dantas, tem um patrimônio arqueológico com pinturas rupestres em inúmeros sítios, para onde estudantes de capital visitam para pesquisas, gerando renda para restaurantes da cidade. No alto de uma colina um morador da cidade construiu o Castelo de Bivar, imitação de um castelo renascentista francês e tornou-se uma das principais atrações turísticas do Seridó, embora seja propriedade particular, e serviu de cenário para o filme O Homem que Desafiou o Diabo, inclusive, chamou a atenção da produção do programa Mais Você, de Ana Maria Braga, que gravou no local. 
          De Carnaúba dos Dantas vem Antonio Pedro Dantas - Tonheca Dantas - aquele que ficou conhecido como o Maestro do Sertão, autor da valsa Royal Cinema, sucesso que está fazendo cem anos. De Carnaúba dos Dantas vem o talento empresarial Durval Dantas, fundador da Maré Mansa, com noventa lojas.
          Tem mais gente talentosa: o historiador-doutor e jovem escritor Helder Medeiros; alguns blogueiros, com destaque para Totinha. Tem uma FM, uma televisão, via internet, a TVJCN, de Juquinha, que também tem o jornal impresso JCN.
           A cidade conta com uma pousada, a Cabocla do Sertão, com piscina para adulto e infantil, farto estacionamento e uma visão bonita do Monte do Galo, a maior atração turística local.    



Monumento ao Vaqueiro, em tamanho natural, do artista Dedé Carnaúba



Castelo de Bivar
Castelo de Bivar: foto de Canindé Soares


Valsa Royal Cinema, de autoria de Tonheca Dantas, de Carnaúba dos Dantas

https://www.youtube.com/watch?v=6r2ljng3TLE

Vídeo do programa MAIS VOCÊ, gravado em Carnaúba dos Dantas

https://www.youtube.com/watch?v=WZbrqfutcsA

Video sobre peculiaridades de Carnaúba dos Dantas

https://www.youtube.com/watch?v=Gfq90FBfc7o