sábado, 16 de março de 2013

De Paris, professor-doutor curraisnovense, informa sobre os Pegado Cortez de Pernambuco.






Povo do Recife homenageou o grande poeta Mauro Motta com obra de arte. Fonte: Google.


  No dia 9 de fevereiro passado, recebi este imeio do curraisnovense Roberto M. Cortez Motta, há muitos anos ausente do Rio Grande Norte, manda algumas informações sobre os Pegado Cortez e Siqueira Cortez, oriundos de Pernambuco. Roberto é doutor em antropologia e professor da Universidade Federal de Pernambuco. Eis o texto:


Meu Primo: Estou em Paris sentindo muito frio (mas adoro esta cidade) e seu email me transportou a minhas origens no Sertão quentíssimo do Rio Grande do Norte. Você e eu somos parentes colaterais, que é o mínimo que posso dizer. Quando muito jovem, correspondi-me com nosso parente João Alfredo Pegado Cortez. Não creio que ele tenha chegado a escrever em forma de livro. Mas me mandou uns papéis aparentemente fidedignos, os quais, meu primo, para vergonha minha, estão perdidos dentro de meus arquivos no Recife. Simplificando, simplificando, de vez em quando eu encontro parentes do Rio Grande do Norte. Mas, pelo lado Pegado Cortez, somos de tronco pernambucano. Nossos antepassados, subindo o curso dos rios, entraram no Rio Grande do Norte, botando currais e tomsndo as terras dos Índios e com estes se misturando, entre o XVII e o XVIII. Desconfio que tomaram parte ativa na chamada "Guerra dos Bárbaros " ou "Guerras dos Janduins" (ou coisa assim). O que eu sei está no attachment a este email. Preste atenção ao livro do nosso do nosso parente Maia, que menciono no attachment, embora nessas coisas, quero dizer, em matéria de genealogia, devemos avançar com muito cuidado. Logo se criam muitos mitos, inclusive o que nos faria descender do conquistador do México, Hernán Cortés (ou coisa assim), o qual, como dizia um contemporâneo, por muito favor era cristão velho.
Enfim, Cortezes de todos os estados e países (temos muito primos aqui em França e nos Estados Unidos) uni-vos para que melhor vos conheçais. (Será que esta forma verbal existe?) Mantenhamos contacto! Seu primo em enésimo grau, Roberto Mauro Cortez Motta.



Antecedentes de Meu Avô
“O avô de fraque, a avó entre os jacarandás, o neto, de qualquer peraltice capaz, desta inclusive de mexer nas coisas mortas.” [1]
Meu avô, Natanael Pegado Siqueira Cortez (1889, Açu, Rio Grande do Norte; 1967, Fortaleza) teve certa importância como líder da Igreja Presbiteriana, até em plano nacional, além de algum destaque na vida da Província, existindo bibliografia a seu respeito. Ele próprio também escreveu muitos trabalhos, sermões ou artigos de circunstância, às vezes de polêmica religiosa, dos quais devo ter grande parte. Para escrever estes comentários, eu mais do que folheei essa bibliografia. Dela se depreende um relato entre heróico e hagiográfico. Natanael era filho de Ismael Pegado Siqueira Cortez e de Umbelina Alves, dele em segundo casamento, dela em primeiro.  Ismael pode ter nascido uns 30 anos antes do filho, isto é por volta de 1860. Os Cortez deviam ser gente abastada. Um parente nosso, João Maia Nogueira, escreveu um livro intitulado Uma Fresta no Tempo: Historiografia das Famílias Maia, Lima Verde, Varela Cortez, Guedes Alcoforado, Nogueira de Castro e Teixeira Mendes, impresso em Fortaleza no ano de 2007. Em determinado trecho, o autor, com o qual eu tenho pelo menos um trisavô em comum (mas acho que mais), alude a um João Pegado Siqueira Cortez, que teria vivido em Pernambuco no século XVIII, sendo mencionado por Borges da Fonseca na Nobiliarquia Pernambucana. Este João Pegado I teria sido, de acordo com o primo, avô, mas avô materno, de outro João Pegado.[2] Este último, se tivesse o sobrenome do pai, se chamaria João Cavalcanti Sá e eu seria Roberto Mauro Sá Motta,[3] o que eu acho muito inferior a Roberto Mauro Cortez Motta.[4]
Entrou sangue índio na ascendência de Natanael, em parte, como quero imaginar, proveniente da Catarina, filha extramatrimonial, mas reconhecida, de Jerônimo de Albuquerque com a índia Maria do Espírito Santo Arcoverde, casada em justas núpcias com o florentino Filipe Cavalcanti.[5] Mas também podia provir de tapuias, “caçadas a dente de cachorro”, como se diz no sertão de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Meu avô era fundamentalmente branco, embora, quando bem observado, se notasse o sangue índio. De uma de suas irmãs por parte de pai e mãe, Júlia, da qual tenho mais de um retrato em meus arquivos, não sei com absoluta certeza se, em matéria de sangue não europeu, tinha só indígena.[6]   





[1] Mauro Mota, Soneto Muito Passadista na Ponte da Madalena.
[2] É possível que João Pegado I, além de avô, fosse padrinho de João Pegado II.
[3] Meu avô, sem a menor dúvida, tinha consciência de sua origem e posição de classe social. Isto não significa que conhecesse detalhes genealógicos. É verdade que, entrando pela ficção, podia, não digo reivindicar, mas admitir Hernán Cortés como antepassado. Porém Nobiliarquia Pernambucana, Albuquerques, Cavalcantis, Maria do Espírito Santo, Dona Catarina, de nada disso meu avô tinha consciência nem com isso se importava. Mas se orgulhava de ter um neto americano que descendia da índia Pocahontas, antepassada das melhores famílias da Virgínia e vizinhança. 
[4] Eu sei que Cortez ou Cortês é nome de vila em Portugal (Vila Cortês do Mondego, Vila Cortês da Serra e talvez outras, já me tendo também constado que houvesse uma aldeia com tal nome, situada perto de Aveiro), além de ser o nome de uma farmácia em Lisboa, na Rua do Ouro ou perto. Nesta farmácia eu estive em março de 2012 (hoje é o dia 31 desse mês e estou no Recife desde o dia 5). Perguntei, muito cortêsmente, por que a farmácia se chamava “Cortez”. Uma senhora, com ar de proprietária, me disse que os donos atuais não têm nada a ver com alguma família Cortez. O nome já seria o mesmo no século XIX. A conversa foi amável e eu terminei com a ameaça jocosa de que iria fazer um processo para reaver minha herança. Cortés (ou Cortès) é nome típico de Cristão-Novo (Xueta) em Maiorca. Consta igualmente que Cortez, Cortês, Cortès ou assemelhados são nomes típicos de Ciganos em Portugal e Espanha. (Mas Courtès, Courtois, Cortese e parecidos são comuns, entre gente que não é nem judia nem cigana, na França e na Itália.) Procurando, encontra-se muita gente com sobrenome Cortês ou Cortez em Portugal e no Brasil. No momento mesmo em que revejo esta nota, o “Google”, que eu naturalmente consultei, está cheio da história de um jogador de futebol que mudou o “nome artístico” (baseado em sobrenome real) de Cortês para Cortez. Cortez é grafia portuguesa arcaica de Cortês, do mesmo jeito que até talvez os anos trinta do século XX, escrevia-se “portuguez”, “francez” e “inglez”, sem risco de castelhanismo. Hernán Cortés, o conquistador do México, não é necessariamente cognato de Natanael, embora este, quando eu tinha uns oito anos, respondendo a uma pergunta que lhe fiz (minha curiosidade histórica vem de longe), admitiu, um tanto sotto voce, que descendíamos desse grande capitão.
[5] Esse Jerônimo de Albuquerque (1510-1584), muito conhecido de historiadores e genealogistas especializados, português muitas vezes denominado “o Adão Pernambucano”, era irmão de Dona Brites de Albuquerque, casada que foi com o primeiro donatário da Capitania de Pernambuco, Duarte Coelho Pereira. É também antepassado, provavelmente várias vezes (e, pelo menos uma vez, através da filha Catarina), de meu pai
[6] Talvez tia Júlia tivesse apenas feito um “permanente” no cabelo.

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